Estou fazendo em março do ano que vem 10 anos de ensino superior e 11 anos e seis meses de serviço público. A meu ver, é uma data a comemorar. Muito me orgulho de ser servidora pública, apesar dos baixíssimos salários que temos recebido. Mas, o que isto tem a ver com a questão que você me fez? Eu sou de uma geração que nasceu no meio da ditadura (1967). Só vim tomar conhecimento de questões políticas por volta dos 17 anos, e quando meus pais perceberam isso ficaram apavorados, preocupados com meu futuro. O temor que a ditadura deixou em todos nós, o medo de dizer o que pensa, de ser contrário à autoridade, está arraigado. Lentamente, vamos nos desprendendo de um temor fundado na cassação da palavra pela força. A condição de servidora pública, a estabilidade que o serviço público nos proporciona, esta conquista que devia estar estendida a todos ostrabalhadores, me obriga a não calar diante de diversas questões que me instigam.
As greves de 2000 e 2001/2002 permitiram a nós uma experiência única: discutir a Universidade... Colocar em cheque a administração do Prof. Jackson... Recuperar princípios que estavam adormecidos entre FG´s, CC´s, planilhas lotadas de afazeres, reuniões intermináveis em que o tema central é a burocracia. Fazer a crítica aos cursos pagos e às taxas, à amarração política dos cargos de confiança, ao uso da coisa pública para fins privados etc. Foi uma lição de exercício de posicionamento ante questões cruciais para a Universidade.
Não me recordo bem em que período, mas quase no fim da gestão Gordon a lista comunidade foi implantada... Pensei: será que eles têm certeza de que querem fazer isto? Ali, a Universidade Pública, a UEL, estava construindo o primeiro espaço democrático para as discussões que desejávamos fazer (basta recuperar as questões que discutimos aqui).
Insisto: primeiro espaço democrático, porque para participar das discussões tanto fazia ser professor, estudante ou funcionário... Tanto fazia ser reitor, diretor de centro, chefe de departamento, coordenador de colegiado, técnico administrativo... A Lista Comunidade é um espaço democrático porque não precisa ser eleito para participar dela... Justamente, porque ela não é CU, CD, CC, sindicato apossado ou sei mais quantas siglas referentes a fóruns de discussão restritos à minoritária - que se fez maioria - docente, onde a burocracia tem mais peso que as discussões de fundo... A lista comunidade coloca em cheque esta democracia oficial.
Obviamente, trata-se de uma democracia restrita... Afinal, quem domina a linguagem para escrever aqui? Mais: quem, nesta Universidade da disparidade na qualificação do pessoal, foi treinado para lidar com esta máquina? Nesta Universidade dos privilégios, quem consegue entrar nas salas de informática e usar os computadores no horário de trabalho, ou fora dele, para discutir? Quem possui um terminal à sua disposição?Sabemos quantos ficaram de fora, mas, ainda assim, muitos dos que estavam fora, estão, agora, contemplados.
Obviamente, as discussões da lista não são primores do pensamento acadêmico. Até porque, elitista, o pensamento acadêmico acha que é bom demais para circular por aqui... Mas, a meu ver, as listas são fóruns privilegiados de debate, de discussão, de circulação de idéias... Defendo isto aqui, e em várias outras listas de que participo.
Os que ocuparam a reitoria nos últimos quatro anos tiveram uma participação central nas greves a que me referi acima... E, penso, esta foi a grande decepção... Ao expor seus pensamentos nos diversos microfones que lhes eram disponibilizados, publicizaram suas posições extremamente democráticas. E, curiosamente, no que toca à comunicação pública, à necessidade democrática de discussão, durante o processo de gestão, deixaram muito a desejar... Converteram-se em extrema direita... Praticamente em Ditadura... Os que tentaram comunicar-se pela lista neste período viram suas mensagens serem, sucessivamente, esquecidas; sucessivamente não publicadas... Fomos calados de várias formas... Nestalista... Nos fóruns de discussão... Nos corredores... Tivemos de recuperaras manobras do Henfil para colocar em discussão algumas questões... Sem querer discutir a forma, penso que a explosão de manifestações que temos tido é um indicativo do sentimento generalizado de insatisfação. Só lamento que sejamos passivos a ponto de não brigar durante o processo... De gritar só depois. Numa espécie de mergulho forçado, ao final do qualnecessitamos urgentemente respirar...
Você me pergunta por que participo aqui. Eu respondo que é porque não quero precisar possuir um meio de comunicação, ocupar um cargo ou ser amiga do rei para tomar conhecimento e discutir algumas das questões que considero centrais para a Universidade...
Pra terminar, brinco colocando em cena uma parlenda: “Cala a boca já morreu: quem manda na minha boca sou eu!”. Não nos enganemos... O “cala aboca” tá vivinho e ocupa os fóruns de poder em busca de novos degraus a escalar... Resta-nos ficar quietinhos ou dar um basta aos diversos “calabocas” que temos sido obrigados a engolir...
Elza Peixoto
Publicado originalmente, revisado pelos editores, no Jornal Notícia - UEL. N. 1088. 28/06/2006